terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Comentem

A ideia de construir um Blog de "O Leme" tem como finalidade essencial dar a conhecer este restaurante. Mas, muito mais do que isso, tem por objectivo reunir à nossa volta os nossos, muitos, amigos. Aqueles que, para além da comida saborosa, nos procuram por se "sentirem em casa" quando aqui chegam. Julgamos, por isso, que é fundamental que esses deixem aqui os seus comentários, sempre bem recebidos, ou simplesmente que usem este espaço para darem "largas à imaginação"...serão todos, os que vierem por bem, bem-vindos. Por isso, não hesitem e escrevam, sempre...

sábado, 31 de janeiro de 2009

Quem somos, o que somos!









O Leme é um restaurante ali à esquerda de quem sobe a Rua do Galo em Angra do Heroísmo. Não é um restaurante qualquer. Tem alma. Que se sente mal se entra e se é acolhido por um dos dois irmãos proprietários do mesmo, o Fernando e o Carlos Costa. Grelhados no Carvão. Carne e Peixe. Garrafeira QB. Entradas escolhidas a dedo e um esparregado do melhor que se come em todo o mundo. São apenas alguns dos condimentos de um negócio que se faz com gosto e dá a gostar a quem gosta de comer bem. Com novos projectos para 2008. Fernando Costa explica, nesta entrevista, como o sonho se transformou em realidade.

- Restaurantes há muitos, bons, maus… O Leme mais do que um restaurante é um conceito. O Fernando e o seu irmão tinham experiência, antes de se meterem na aventura deste espaço?

-Há sensivelmente 15/20 anos, o meu pai comprou um boteco, a casa Leão, em frente às finanças e tivemos aquilo durante uns seis meses. Depois vendemos, e dali a um ano tornámos a comprar. Tornámos a fazer a casa, mas nada do tipo do Leme, era tipo prato do dia, de comida caseira. E este gosto veio do meu pai, que fazia uns cozinhados aos sábados, em casa. Fui vendo, fui aprendendo com ele algumas coisas, fui fazendo também. Esta ideia do restaurante era uma coisa que eu gostava de experimentar. E apareceu a oportunidade de fazer e fiz, sempre com algum receio, porque estas coisas são sempre complicadas, o meio é pequeno… Continuo a dizer que quando se envereda por um restaurante e quiser dar algum tipo de qualidade é complicado.

- O que noto neste restaurante é que, mais do que ser um sítio onde comer, há aqui uma espécie de conceito. Da mesma forma como na música. Os Pink Floyd, por exemplo, introduziram os chamados concept álbuns, ou seja, todos eles elaborados, que contavam uma história, não eram só faixas isoladas. Havia um fio condutor. O que parece que existe muito neste vosso restaurante. Primeiro, só há grelhados – seja peixe ou carne – depois, há uma certa maneira de estar, uma certa maneira de atender o cliente, há um certo intimismo entre as pessoas, uma certa cumplicidade; até a brasa em que se faz o grelhado não é uma brasa qualquer. Este não é “mais um restaurante”. É um restaurante que obedece a um determinado conceito. Foi pensado já assim, ou aconteceu naturalmente?

- Foi pensado quando se comprou o restaurante. Fechamos a casa porque tínhamos que fazer algumas obras. Depois é que se pensou no que é que se iria fazer, embora a ideia de fazer uma casa só com grelhados, só com carvão – carvão esse que é vegetal – nascesse depois. Julgo que as pessoas que cá vêm ajudam a criar esse conceito. Se há sucesso nas coisas, em qualquer tipo de negócio, é por causa das pessoas. De facto há grupos de amigos que cá vêm, começam-se a criar pequenas tertúlias onde se discute quase tudo. E é assim. Esse conceito foi nascendo naturalmente.

-Ou seja, há dois tipos de restaurante: há aqueles onde se vai comer, e há os outros. Há muito mais restaurantes onde se só se vai comer e muito menos dos outros…

- Também concordo.

- Eu como jornalista, se pusesse um microfone debaixo de cada uma destas mesas, todos os dias teria uma caixa…

- Isso aí era muito complicado [risos].

- No fundo, este espaço acaba por ser também um ponto de encontro, mais até do que a comida. A comida é muito boa, mas é um pretexto para qualquer coisa mais do que a comida. A ambiência, a possibilidade de encontrar alguém que é difícil de encontrar e que se encontra aqui com facilidade e depois se trocam palavras são precisas de ser trocadas… Sente que esse clima existe aqui no Leme?

- Eu acho que sinto esse clima. As pessoas que vêm, gostam de cá estar, sentem-se bem, existe de facto esse gosto pelo restaurante. Mas, no meio disso tudo, a comida é importante. As pessoas voltam não só pelo gosto de conversar, mas também pela comida.

- Mas a comida aqui é diferente. Vai logo desde a qualidade dos produtos, a carne é sempre tenra, o peixe não só é sempre fresco como é diferente. Há todo um pano de fundo que vocês constroem, provavelmente, dia-a-dia, desde muito cedo, já que as compras se fazem, bem feitas, logo pela madrugada para serem frescas. Todo este trabalho é preparado…

- Está a dizer a verdade. O melhor peixe compra-se mais cedo. Bem cedo tenho a possibilidade de comprar peixe diferente, e em mais quantidade. Quanto à carne, é diferente. O segredo é trabalha-la. Só temos quatro pratos de carne. Um deles é a costeleta. Recebe um tratamento especial daí que é mais tenra que o habitual. Quanto à questão do gosto da comida ser diferente, é o carvão que lhe dá esse toque. Nos Açores estávamos mal habituados, e continuamos a estar. Não estou a dizer que sei fazer melhor que os outros. Eu também não sabia; fui buscar o know-how lá fora; tive que contratar uma pessoa para o fazer. Isto tem a sua ciência. Continuo a dizer que na Cozinha das coisas mais difíceis de fazer é grelhar o peixe e traze-lo para a mesa com a pele. Com a pele presa ao peixe; não é presa na grelha. É uma arte. E há pessoas que têm essa experiência. E claro que eu, fui buscar uma dessas pessoas lá fora, e fui aprendendo também com essa pessoa. Por isso é que tem esse tal gosto especial. A pele dá o gosto ao peixe. Da mesma maneira, se tirarmos a pele toda à carne ela fica desenxabida também, não é?

- Também aqui se nota, um pouco como o mundo de hoje, a chamada especialização. Aqueles restaurantes que têm ementas com 30 pratos acabam por ser de tal forma generalistas que aqueles pratos todos exigem, para já uma retocagem enorme de matéria prima…

- Exactamente…

- Por outro lado, atraem um público muito diferenciado. Enquanto que um restaurante que tenha meia dúzia de pratos induz um espírito de confiança no cliente, em que o cliente praticamente nunca usa a ementa. Deixa quase ao vosso critério o que acharem melhor. E isto é um a cumplicidade que torna o restaurante propício a ser um espaço de tal forma intimista que a confiança entre quem aqui vem e os donos…

- É verdade! Exactamente, é verdade.

- Isso é pensado ou acontece naturalmente?
- Na questão dos pratos foi pensado, porque eu também sou daquele tipo de pessoas que não gosto de ir a um restaurante e ver 20, 30 ou 40 pratos. Algum daqueles, na minha óptica, não será tão bom como os outros. Julgo que é muito mais aliciante ir a um restaurante que tem meia dúzia de pratos e que sabemos que aquela meia dúzia de pratos é boa. Com meia dúzia de pratos a rotatividade é maior. Se tenho meia dúzia de pratos, significa que saem todos os dias, se eu tiver 30 pratos, ou 30 variedades diferentes de coisas, não podem sair. Por isso a questão de poucos pratos é importante para ser sempre fresco, para dar essa oportunidade ao cliente de ele se sentir bem, e de sentir que está num sítio de confiança.

- Outra coisa que é fundamental num restaurante é a garrafeira. O vinho, há alguns anos, entrou na moda, entrou no consumo nomeadamente no segmento médio/médio-alto da população, que o caso do Leme. A garrafeira também obedece ao mesmo conceito? È mais diversificada ou menos diversificada? Ou ela é também limitada, de forma que quem vem aqui sabe que encontra determinado nível de vinhos?

- Não posso dizer que é limitada, mas também não tem muita variedade. Eu entendo que a questão dos vinhos numa casa passa por duas situações: pelo gosto do proprietário e pelo que o cliente pede. Mas passam muito pelo que o cliente pede. Eu posso não gostar muito de um vinho e o cliente gostar, e eu sou obrigado a tê-lo porque o cliente pede. Nesta fase, com dois anos de experiência, apercebo-me que há um tipo de vinho que se vende sempre. E eu tenho que apostar: se o cliente pede, eu tenho que o ter.
Uma grande panóplia de vinhos é bom para quem vem de fora, vê uma garrafeira enorme e tem muita hipótese de escolha. Mas 50 ou mais de 50% da minha clientela é de cá, e por isso tento ser o mais fiel possível aos meus clientes. Isto obriga-nos a fazer este tipo de gestão.
E falando em gestão, não vale a pena ter uma garrafeira muito grande que é um empate de capital também muito grande. Quanto menos empate de capital tivermos numa situação destas melhor.

- Noto que tem clientes fiéis. Em dias de temporal, ou a meio da semana, à noite, o restaurante enche. Mesmo num dia de semana. Não sei se é tudo gente da ilha Terceira, se são pessoas que estão sazonalmente aqui, e procuram o restaurante, pelo passar da palavra, ou estão habituados, a verdade é que de uma forma geral não tendo uma casa muito grande ela está sempre e perfeitamente composta. Como é que consegue isto? Não o vejo fazer grande publicidade.

-Pois eu acho que a melhor publicidade que se faz é aquela de boca em boca. O nosso lema é não fazer grandes publicidades e sim, as pessoas passarem a ser a nossa própria publicidade. O espaço também não é grande. Trinta e tal pessoas enchem a casa, apesar de poder ir mais além. É um restaurante para 40 pessoas. A ideia de um restaurante pequeno é essa mesma, a pessoa entra, vê que a casa está minimamente composta, acaba por sentir que aqui se come bem. Se a casa está cheia é porque se deve comer bem. Quanto aos clientes, os tais 50% de fora da ilha aparecem na tal publicidade dita no dia-a-dia, e os próprios hotéis também passam essa publicidade.

- Cada um é para o que nasce, ou isto não é para quem quer, é para quem sabe. Tem a noção exacta de que o Fernando, o seu irmão e a sua equipa – aquela que lida directamente com o cliente – conseguem criar um clima de intimidade qb – que não é nem por defeito nem por excesso? Que cria uma cumplicidade fundamental para quem pensa “onde é que eu vou? Vou ao serrado? Ou ao João?” Isto é uma coisa que nasceu convosco? Não se aprende na escola nem na universidade…

- Esta equipa trabalha para que isto seja possível, assim, todos os dias. Talvez tenha essa aptidão e o meu irmão também. Somos pessoas que temos experiência no comércio. Não só neste ramo. Lidamos todos os dias com clientes, e já sabemos, mais ou menos, como é que o cliente gosta de ser tratado. O cliente de restaurante é um bocadinho diferente dos outros clientes. É mais exigente, e com razão: a pessoa está a pagar e gosta de comer bem.
Numa terra pequena, toda a gente se conhece. Se me chega um cliente ou um amigo com um problema eu tento ajudar. Se for uma coisa que eu possa ajudar, porque não ajudar? Ou também se troca uma anedota ou uma graça, e o cliente sente-se bem.

- Falando de turismo. O restaurante está inserido nesta fase de crescimento do turismo nos Açores e na ilha Terceira. Tem alguma preocupação de expansão para dar resposta a esse aumento de potenciais clientes, ou tendo a casa feita ao fim de dois anos e meio é quanto baste?

- É complicado de responder neste momento. Normalmente, de todas as vezes que uma pessoa se muda por esse motivo, geralmente dá bronca. Num espaço maior, se calhar a qualidade do serviço passa a ser outra, e aí passamos a ter mais clientes e a qualidade se calhar baixa um bocadinho. Mas não está de parte dizer-se que isto poderá passar para outro sítio. Mas ainda não estou em condições para isso. Por enquanto, é aqui que estou.


- Há um projecto que 2008 vai trazer aos clientes e potenciais clientes do Leme virado para a vertente do turismo que é uma carrinha fantástica. Quer falar-nos desse projecto?

- Sim, posso dar uma achega. É um serviço virado para o cliente que durante o fim-de-semana, ou não, bebe mais um copo ou outro e se torna complicado levar o carro para casa. Em lugar de chamar um táxi, dispõe de uma carrinha que com certa dignidade o leva a casa. Ao cliente e não só; se chegar aqui uma pessoa que queira usar do serviço, por que não faze-lo? Estamos a tratar desse assunto e, em princípio, daqui a muito pouco tempo temos esse processo.

- Essa carrinha não irá só servir o restaurante…

- Basicamente é para servir o restaurante. Mas a publicidade que passa de boca em boca pode trazer-me uma pessoa que me diga que gostava de ir a tal sítio. Bem a carrinha estará ali, é para isso, e está legalizada para esse serviço.